A minha mesa de café, o meu banco de jardim, o meu muro de lamentações, a minha varanda para o mundo

sábado, 27 de dezembro de 2014

Sobre a minha tia ;sobre doenças, sobre maus Lares e pessimos filhos.

Hoje,estou muito triste!! Talvez por isso mesmo o reatar a escrever neste Blog seja a forma que inconscientemente busquei para esquecer. Fui visitar uma tia minha ,integrada num Lar de terceira idade e cujo nome nao digo por absoluta decencia. Sou absoluta e tenazmente, critica destes armazens de velhos, desde que pus os pes pela 1ª vez, num deles ,no exercicio da minha profissao de assistente social. E quantos eu conheço!!! Mais novos ,mais velhos, grandes ou pequenos todos eles ou quase todos padecem do mesmo mal. Ha falta de gente capaz de cuidar dos idosos e quando digo capaz falo nao apenas do cumprir os requisitos basicos como sejam a higiene e a alimentaçao. Falo de um pouco mais. Falo de atençao .Falo de carinho. Falo de humanidade, ponto. É aterrador entrar numa sala cheia de idosos sentados em cadeiras encostadas as paredes dos dois lados,um em frente ao outro, de uma sala. Eles arrumados, quietos, cinzentos ,tristes, diria moribundos, sem uma centelha de vida, nos olhos mortiços. Agarrados às bengalas, com as maos engelhadas que cruzam uma sobre a outra como quem nada mais tem que fazer a nao ser esperar, numa espera silenciosa, inane e inutil. Ha os que ainda veem. Ha os que ainda falam mas as palavras sao apenas sussurros assustados. Rostos de angustia onde a vida lavrou fundos sulcos e aos quais um doloroso quotidiano vai dando o aspecto petrificado das estatuas. Habituei-me a estas imagens quase diarias. Ou melhor,nao nao me habituei. Se me tivesse habituado nao terias sido tao dolorosa a visita que hoje fiz a minha tia. Encontrei-a sentada e presa a um cadeirao, colocado estrategicamente, num canto da sala. Sofre de Alzheimer a minha tia. Nao se lembra de quase nada, como é natural em quem sofre de tao terrivel doença. Mas olhou para mim e disse imediatamente: "A minha Eulália" . E eu que ao ve-la me choquei com a imagem tao diferente da tia que eu conheci, desabei e comecei a chorar baixinho e de cara voltada para o outro lado. Era o corte e a cor dos cabelos ; era a cor da pele; sem ser palidez era a sua pele que tinha mudado de cor. Nao era ja o rosto moreno de tantos sois, era uma cor que a clausura fez forçadamente branca. Pediu-me para a levar dali. Tive de mentir e dizer que o carro estava muito longe. E ela a tratar-me por você como se eu fosse alguem que nao do seu sangue. A dizer-me para trazer de volta a caixa de bonbons que lhe levava . Nao os queria. A dizer-me que os meus primos, quando perguntava por cada um deles,a viriam buscar amanha. Os mesmos que ali a depositaram e ali a deixam passar domingos e dias santos! A minha tia que nunca se calava, que falava e ria estava ali entregue a desgraça da sua doença e do seu abandono, silenciosamente. Quando falava fazia-o como quem repete inutilmente sempre as mesmas palavras:"quero ir para a cama", "quero ir embora" Nao tenho os cordoes". era o seu ouro eram os seus cordoes de ouro , comprados a custo ,com os proventos de um trabalho arduo. Minha pobre tia!! Espoliada das suas coisas,dos seus pertences, dos seus afectos, das suas memoria !!! A minha tia presa por um cinto que lhe cobria a zona pelvica, dando-lhe apenas espaço para se baloiçar num movimento pendular e inquietantemente continuo. E eu pensava enquanto a via, se nao haveria um meio dos filhos a cuidarem na sua casa, sob as suas telhas ,a respirar o mesmo ar e apanhar o mesmo sol do lugar onde nasceu ha 84 anos. Dir-me-ao uns que sim mas a maioria decerto me dira que a ferocidade da doença nao da espaço a esses sentimentalismos." As pessoas têm de trabalhar; as pessoas tem direito a ter as suas vidas; As pessoas nao podem lutar contra a inevitabilidade da morte!" Conheço bem de mais as justificaçoes! Os meus primos, sem serem gente abastada , vivem confortavelmente,como alias vivem muitos outros filhos.A minha tia esta num Lar onde a solidao,tristeza e o abandono coabitam com a incuria e a negligencia,a como alias estao milhoes de outros idosos!!Tudo verdades de La Palisse !!! É tudo questao de decoro . E de humanidade. de uma forma e de outra. De um lado e de outro.

A foto de uma carta de Florbela Espanca

Prometi escrever mais, mas nao prometi ser mais metodica. E jamais prometerei pois nao seria capaz de cumprir e entao mais vale nao prometer. Esta é a fotografia tirada a uma carta Real,verdadeira, escrita por Florbela, por gentileza do meu amigo Figueiredo seu fiel depositário e sortudo dono. Foi uma noite encantadora a remexer escritos de grandes nomes das nossas lusas letras.
Esqueci-me mesmo deste blogue. De longe a longe lembro-me que existe mas nao tenho tempo para me sentar e escrever qualquer coisa. Ou disposição. porque tempo sempre se arranja se o quisermos. Tanta coisa aconteceu desde entao ! A foto publicada em Março de 2013 aparece isolada e com o titulo "Um amor enorme que também me morreu" E não, nao falava de um qualquer amor por alguem do sexo oposto.A perda desses amores vou-as digerindo lenta e silenciosamente. Falava da minha pequena cadela , morta em bárbaro acidente e cuja perda me deixou tremendamente abalada.Tenho agora uma outra , lindissima e que adoro mas que nao substitui de forma alguma a minha querida Frida , por quem ainda hoje choro. Sou assim. Este poço enorme de sentimento , e para rimar, de sofrimento. Voltando ao começo,rapidamente : vou ver se escrevo aqui mais amiude!